O Movimento Primeiro de Março ou Movimento Samil (que literalmente significa “Três-Um” – Movimento 3.1) foi uma das primeiras demonstrações públicas da resistência coreana durante a ocupação japonesa. O Japão proclamou a anexação da Coreia como estando sob seu domínio em 1910, ocupando completamente o país, depois de ter estado na península durante alguns anos. Hoje a data é comemorada como um ponto crucial na história e foi determinante para a emancipação coreana, resultando em um país de imenso potencial político, econômico e cultural.
Às 2 da manhã do dia do movimento, 33 nacionalistas que compunham o núcleo do Movimento Samil se reuniram no restaurante Taehwagwan, em Seul, para ler a Declaração de Independência da Coreia, que foi elaborada pelo historiador Choe Nam-seon e pelo poeta Manhae:
Proclamamos aqui a independência da Coreia e a liberdade do povo coreano. Nós o declaramos ao mundo em testemunho da igualdade de todas as nações e passamos para a nossa posteridade como seu direito inerente. Fazemos esta proclamação, tendo 5000 anos de história e 20 milhões de pessoas unidas e leais. Tomamos este passo para assegurar aos nossos filhos, para os tempos vindouros, a liberdade pessoal de acordo com a consciência despertadora desta nova era. Esta é a clara liderança de Deus, o princípio em movimento da era atual, a reivindicação justa de toda a raça humana. É algo que não pode ser eliminado, sufocado, amordaçado ou suprimido por qualquer meio.
A história
Entre 1885 e 1905, o Japão mostrou seu poder bélico por meio da industrialização e grande interesse nas terras da península coreana, recebendo apoio dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha. Na época unificada como Império de Joseon, a Coreia também despertou o interesse do Império Russo, que retrocedeu, retirando suas tropas. Os EUA e o imperador japonês firmaram então um acordo permitindo a colonização da Coreia e das Filipinas. Meia década depois, seria anexada oficialmente a Coreia ao Império Japonês, com o pretexto de que essa decisão seria tomada pela paz e bem-estar dos coreanos, dando ao Japão a soberania dentro do país: sem qualquer apoio internacional e fracos militarmente, o Imperador Gojong não teve opção senão aceitar.
O documento continha oito artigos, mas nenhuma das cláusulas descrevia a truculência militar ou a censura a demonstrações culturais nacionais: era proibido que o idioma coreano fosse ensinado. Documentos da época afirmavam que essa era uma ação filantrópica para “civilizar” a população. As colheitas de arroz foram direcionadas para o abastecimento do império nipônico, e os coreanos quase não tinham direitos de cidadania.
Com o fim da Primeira Guerra Mundial (1918), muitos dos regimes imperialistas estavam se desfazendo, criando novas nações independentes, e os movimentos pela independência surgiram não somente dentro da península, mas em embaixadas ao redor do planeta, como em Xangai e Nova York. Em 21 de janeiro de 1919, o último imperador da Dinastia Joseon, Gojong, falece em circunstâncias suspeitas, logo após a Conferência pela Paz em Paris não ter alcançado a libertação da península, e começam a surgir rumores de que o mesmo havia sido envenenado pelo regime japonês!
O funeral do Imperador Gojong estava previsto para 3 de março de 1919, em Seul. No mês que antecedeu o evento fúnebre, as instituições que haviam surgido incutindo a ideia de liberdade começaram a movimentar-se, espalhando a ideia de uma revolução pacífica em um terreno em que o luto e o patriotismo estavam no auge. Em 1 de março, milhares de coreanos apareceram balançando suas bandeiras e cantando o hino nacional na praça Tapgol para ouvirem a declaração de independência por intermédio dos ativistas, que incentivaram passeatas pacíficas.
Aquela foi um das primeiros (entre mais de 1500 manifestações públicas). As informações de reuniões pacíficas passadas oralmente foram o suficiente para incitar uma resposta japonesa: prédios, igrejas e escolas foram queimados até às cinzas e milhares de ativistas foram mortos naquele ano e nos anos seguintes, com cerca de 7000 pessoas mortas pela polícia e soldados japoneses e 16.000 feridas.
Yu Gwan-sun
Yu Gwan-sun (1902-1920) nasceu em uma pequena cidade próxima a província de Chungcheong do Sul, vivendo parte de sua vida em uma aldeia agrícola. Yu estudou na universidade atualmente reconhecida como Universidade Feminina Ewha e aos 16 anos começou a participar ativamente do movimento de resistência. No dia 1 de março, Yu Gwan-sun e seus colegas foram às ruas de Seul para declarar a independência da Coreia; em represália, o governo japonês exigiu que todas as escolas fossem fechadas em março. Yu retornou para a sua cidade natal, porém lá espalhou nas aldeias as notícias sobre o movimento. Por causa disso, a manifestação ganhou força e, em abril, cerca de 3000 pessoas foram protestar em frente ao mercado da região, mas a polícia japonesa retaliou: Yu foi presa, e seus pais foram mortos, assim como os demais manifestantes.
Yu foi levada para a prisão de Seodaemun em Seul e, de lá, ainda expressava seu apoio à independência da Coreia. No primeiro aniversário do Movimento Primeiro de Março, Yu conseguiu organizar um protesto em larga escala na prisão e, devido a isso, foi transferida para uma cela subterrânea onde foi espancada e torturada! Suas últimos palavras antes de morrer, aos 17 anos, devido a desnutrição e ferimentos, foram:
Meu único remorso é não poder fazer mais do que dedicar minha vida ao meu país.
Os resultados dos esforços conjuntos foi a criação do Governo Provisório da República da Coreia em abril de 1919: aquele momento de luto iniciou uma tradição em memória de todas as vozes da rebelião, estruturando oficialmente as bases para um governo democrático. Por fim, em 1945, o Japão foi derrotado e sentenciado a liberar todas as nações que havia anexado. O dia 1 de março foi definido como feriado em 1949 e, desde então, anualmente a bandeira sul-coreana é hasteada dentro das casas e outros estabelecimentos ao redor do país, além de lerem a “Proclamação de Primeiro de Março pela Independência Coreana” no mesmo local em que foi lida pela primeira vez. Em homenagem à data, deixo esta frase: Mansei! Mansei! (que significa viva a Coreia ou que a Coreia viva 10.000 anos).