Oi, Hikari andou sumida no mês passado porque estava se adaptando a mudanças aqui na J-Hero. Bom, mas uma pausa significa mais tempo para pensar (como diria o Patrick do Bob Esponja hahaha) e com mais tempo para pensar (não consigo deixar de rir agora) pude fazer mais uma leitura que trago para aqueles que gostam de saber um pouco mais sobre esse nosso universo conhecido como “Cultura Otaku”.
Recentemente fiz duas boas leituras sobre a temática. A primeira sobre Cultura Pop Japonesa e a segunda sobre nós – otakus – como indivíduos na sociedade. É certo que para que entendamos nossas manias que definimos como “coisas de otaku” é necessário conhecer as ditas raízes da questão: o otaku japonês.
(Minha edição do livro de Étienne Barral)
E que forma melhor de se fazer isso do que lendo “Otaku: filhos do Virtual” do jornalista e ensaísta francês Étienne Barral, erradicado no Japão de 1986, que entre sua vida como redator no semanário nipônico Aera (pertencente ao mais importante grupo de imprensa do Japão, o Asahi Shimbun) e a carreira de pesquisador construíram essa que é a mais expressiva obra sobre o tema desde o início do século XXI.
Em três bons momentos, Barral aponta a “Sociedade dos otaku”; “Os otaku na sociedade” e o “Otakaumismo”, que nada mais são suas percepções a cerca do grande número de artigos de jornais, revistas, tele-reportagens e entrevistas que ele produziu e pesquisou durante seis meses no ano de 1999 a fim de apresentar ao mundo uma definição conclusiva do que Akio Nakamori (1983) já havia dito sobre esse grupo de fãs que após a explosão de sucesso provocada pelo anime Space Battleship Yamato 2199 criaram nas terras nipônicas e foi apresentado como “otakismo”.
(Personagens do anime Space Battleship Yamato, onde o otakismo deu início)
PARTE 01 – SOCIEDADE DOS OTAKU
Nessa primeira parte, Étienne Barral fala de imediato sobre o cenário que ele presenciou durante a pesquisa. Uma “Sociedade dos otaku” para ele é o que define o título da obra. Ser “Filho do Virtual” é dizer que os otakus nasceram mais do que definitivamente graças aos novos processos tecnológicos de comunicação.
Os japoneses que não se encaixavam no modelo igualitário e excluídor de diferenças formado no país após a perda da 2ª Guerra Mundial fez nascer um grupo de jovens que buscavam outras formas de se fazerem independentes.
A forte influência da mídia japonesa acabou levando-os a tomar o caminho contrário de muitos. Ao invés de serem apenas consumidores do que o mass media (mídia de massa) oferecia, eles passaram a replicar esse conteúdo, só que de uma forma exclusivista e cheia de pessoalidades. Eis aí o surgimento dos fanzines, garage-kits e dos gamers entre outras formas de otakus que se possa imaginar.
“Ao desviarem a mensagem inicial das mídias, confundindo os objetivos da sociedade de consumo que utiliza as mídias para seduzi-los, os otaku mostram, inconscientemente, que não são fantoches.” (E.B.)
É com esse pensamento que grandes movimentos ganham força. Um deles, ainda hoje presente é o Comiket, que reúne milhões de pessoas todos os anos para o consumo desesperado de fanzines, que antes nada mais eramdo que subprodutos midiáticos e que hoje movimentam todo um mercado cultural e financeiro.
Em várias linhas, Étienne Barral apresenta como os jovens japoneses, ao se organizarem, puderam dar as bases para um dos maiores movimentos culturais midiáticos presente na história recente da humanidade: o otakismo. Isso não se parece muito com o que fazemos hoje em dia nos eventos, sites e fóruns da vida?
(Mangás, onde tudo começou!)
OS OTAKU NA SOCIEDADE
Aqui conhecemos as primeiras consequências que essa forma de cultura de nicho traz a seus membros. Pode até ser que o que Étienne Barral encontou em seu período de pesquisa não se reflita nos otakus do resto do mundo, mas é de conhecimento comum que no Japão os otakus são vítimas do preconceito.
Isso porque os japoneses não são muito adeptos de quem é diferente. Marchar contra a onda que segue o grupo em que se vive é encarado como algo ruim. Rejeitado pela sociedade, o otaku japonês tem a tendência a se preservar em “casulos” de seu próprio mundo ideal.
“O otaku é apenas um adolescente hesitante entre a infância e a idade adulta. É um ser que se adapta à paisagem da revolução do software e a fantástica aceleração das mutações da era pós-industrial. Perito em altas tecnologias, ele inventa, testa, compila e, muitas vezes, dá as chaves que permitem compreender em que sociedade vivemos. Aparentemente passivo, ele é, de fato, a expressão de uma crítica notável de nossa sociedade e uma espantosa maneira de se adaptar aos famosos ritos “nômades” (E.B.)
Talvez por isso a Internet seja a sua maior arma de expressão.
“É aliás, sintomático que sejam seu meio privilegiado de comunicação as mensagens das redes eletrônicas e a Internet, onde aparecem apenas com pseudônimo. A constituição dessas redes leva à criação de uma verdadeira cultura underground, com suas referências, seus pontos de encontro, sua legenda, sua linguagem”. (E.B.)
(Idols são paixão no Japão! Love Live é o anime onde elas ganharam a vez e os fãs!)
OTAKAUMISMO
Nessa terceira e última parte da obra, Étienne Barral, relembra-nos de fatos não muito legais, que mancharam por muito tempo a imagem dos otakus. A primeira, e mais emblemática, o Caso M. (como ficou conhecido a série de sequestros e mortes de meninas cometidas por um tal Miyasaki, mídiaticamente famoso por ter sido um otaku) e o caso que dá nome esse momento do livro: a Seita Aum.
Essa seita, formada por vários otakus japoneses que se voltavam contra a política e o estilo de vida nos anos 80/90, ficou conhecida por uma série de mortes e atentados com gazes tóxicos em Tóquio e região. Seu líder, um otaku lunático, chegou até mesmo a se declarar ser o Salvador.
Mesmo com essa imagem pejorativa que a mídia conservadora montou sobre esses excessos do que realmente compõe a comunidade otaku, a cultura e práticas desenvolvidas ao longos dos tempos extrapolaram os domínios ultramarinos japoneses e chegaram ao Ocidente criando esse grupo unido e maravilhoso que são os otakus do novo mundo. O Brasil é um dos maiores exemplos disso.
Para encerrar esse pequeno fichamento deixo a dica: Leiam esta obra ela nos ajuda há compreender um pouco mais sobre esse universo que gravitamos chamado Cultura Pop Japonesa. Fiquem com esta palavra final de Étienne Barral e não tenha medo/vergonha de ser um otaku.
“[…]o verdadeiro otaku é aquele que é capaz de enxergar o objeto de sua paixão por todos os ângulos possíveis. Ao assistir um desenho animado, não basta abandonar-se a uma leitura passiva, mas também é preciso procurar decifrar, por trás da imagem, a verdadeira significação da obra.” (E.B.)
REFERÊNCIA:
BARRAL, Étienne.Otaku: Filhos do Virtual. Editora Senac-SP, São Paulo, 2000.