Em 1987 foi lançada no Japão uma das franquias mais influentes da história dos jogos eletrônicos: Megaman. Tal franquia estabeleceu o conceito que se entende hoje como “shooters de plataforma”.
O potencial deste jogo de mais de 30 anos se dá em diversas áreas. Além de várias continuações, sucessores espirituais, e spin-offs dos jogos que copiam a fórmula de Megaman, o que mais me chama a atenção é o seu potencial artístico.
É potencialmente infinita a quantidade de edições dos sprites de Megaman que se pode encontrar na internet. Trabalhos feitos por fãs utilizando-se do mesmo estilo, caricaturas ou personagens originais pesadamente baseados nas artes do jogo da Capcom.
Por que a arte é tão impactante em Megaman?
Primeiramente, vamos entender as referências de Megaman. Seu criador, Keiji Inafune, trabalhou essencialmente na arte dos projetos, sendo responsável pela arte conceitual de todos os personagens. Considerando o tamanho limitado das equipes, ele também foi responsável pela digitalização e “pixelização” dos mesmos.
Além de estudar outros jogos lançados no mesmo período, Inafune buscou várias referências nas artes com estilo mangá da época, sendo a sua principal referência para o projeto o conhecido Astro Boy.
É possível perceber claramente as semelhanças entre as artes de Megaman com o trabalho de Osamu Tezuka em Astro Boy. Tais semelhanças são propositais e se dão por todo o alinhamento entre as duas obras. Seus protagonistas robóticos com consciência humana e superpoderes para combater o mal, enquanto ainda ressoavam com o público juvenil.
Dessa forma, já fica evidenciada a natureza do design em Megaman: o personagem é comercialmente viável e tem sua estética pautada na animação japonesa. Existia, entretanto, uma grave limitação com a qual Inafune teve que lidar, e isso marcou completamente o seu design.
Cores e resolução. Como as limitações influenciaram no design do personagem.
Na produção de jogos que utilizam de pixel art, uma das etapas mais sensíveis é a “tradução” da arte tradicional para os pixels limitados. O console em questão era o famoso Nintendão. A plataforma tinha capacidade apenas para uma paleta de 56 cores, e sua resolução era mínima, contendo apenas uma área de 256×240 pixels. Isso é menor do que o display da maioria dos celulares de hoje em dia, para se ter uma ideia. O próprio Megaman, em sua pose padrão, mede 21×24 pixels.
Essa é uma área de trabalho consideravelmente pequena, o que resultou na necessidade de fazer algumas escolhas difíceis para o design: para seguir com a estética no estilo de anime, os olhos nítidos eram pré-requisitos para a tradução de qualidade da sua arte conceitual. Isto resultou no tamanho da cabeça do personagem em proporção ao corpo: a cabeça ocupa uma área de quase metade da base do personagem.
Todo o espaço para a construção de um rosto expressivo acaba por tomar espaço de quaisquer eventuais detalhes do corpo do personagem, resultando então num corpo obrigatoriamente simples.
O efeito final disso é uma arte extremamente legível! O personagem tem uma silhueta forte, todo o seu corpo é nitidamente visível, e as expressões do personagem são muito bem visíveis. Considerando o legado da franquia, faz muito sentido que os designs de personagem sejam tão conceituados. Esse foi o design vigente que norteou toda a arte subsequente da franquia.
Concluindo
É muito curioso quão forte foi o branding do personagem. Hoje em dia o Megaman é uma marca plenamente reconhecida. Embora seu design não tenha nítidos diferenciais, sua presença ao longo desses 30 anos transformaram seu design, sua silhueta e sua simplicidade numa figura amplamente difundida e única.
Talvez o jogo ter surgido tão cedo na indústria dos games seja determinante para o seu sucesso, talvez o empenho da equipe em continuar produzindo jogos para a franquia ou até mesmo a quantidade de spin-offs ao longo do tempo fizeram seu papel para eternizar o personagem.
Sem dúvida, o esforço de manter o personagem fiel à sua arte conceitual, à sua estética original, e traduzir o protagonista de forma tão sólida para o pixel art foram determinantes para o sucesso do Megaman, fazendo dele uma das propriedades intelectuais mais conhecidas da Capcom e um ícone de toda a cultura de videogames.