Olá, ouvintes e leitores da Rádio J-Hero, que são estudantes do Ensino Fundamental, do Ensino Médio, que estão lutando para entrar em uma faculdade, ou que já estão contidos nessa desgastante vida universitária.
Vocês que talvez tenham que conciliar isso tudo com um emprego, ou dois, além de família, tarefas de casa, etc. Vocês que não veem a hora que o final do dia chegue para se divertirem com seus meios de entretenimento. Ou mesmo os que não tem o que fazer.
Sim, resolvi enquadrar o máximo de grupos possíveis nessa introdução, pois é exatamente assim que o meio otaku é: vasto! E, digo mais, não só é assim nesse nosso seleto grupo de pessoas que curtem a cultura japonesa em geral, indo de desenhos animados e mangás até a j-music e tokusatsus e todo desdobramento possível, a vastidão de opiniões e histórias diferentes está presente em qualquer “tribo” – na galera que curte funk, no pessoal que gosta de ir numa balada sertaneja, naqueles que andam de skate, nos adeptos dos MMORPGs… Em tudo há pluralidade.
E foi justamente pela falta de pluralidade que o site UOL deu uma das maiores barrigadas desse ano.
Contextualizando, No dia 21 de agosto de 2015 foi publicada na fanpage do UOL um vídeo de uma matéria chamada "Quem sou eu?", escrita e dirigida pelo jornalista Rodrigo Bertolotto e com comentários da psicóloga Leda Zancanella e da psicanalista Gislaine Dominicis. Vocês podem assisti-lo dando play aqui em baixo:
Cosplay: adolescente que se fantasia demais tem problema de identidade? http://bit.ly/1E8a3dr
Posted by UOL Notícias on Sexta, 21 de agosto de 2015
Que bacana juntarem todos aqueles que fazem cosplay, seja por diversão ou profissionalmente, e qualificá-los como possuidores do transtorno de personalidade, não é?
Vejam que edição maravilhosa essa, pegando os momentos específicos de cada entrevista e colocando de maneira a parecer com que cada cosplayer REALMENTE ache que é o personagem encarnado. Se atentem também para os trechos devidamente selecionados das conversas com as profissionais em psicologia, que, provavelmente, devem ter sido bem longas e contextualizadas, mas aqui, pinçando apenas o necessário para reforçar o ponto de que aqueles que se fantasiam são doentes mentais.
Então, me deixem entrar de fato nesse samba que estão tentando tocar. Olá, redação da UOL. Sou o Igor, tenho 22 anos, fiz cosplay durante boa parte da minha adolescência. Minha paixão pelo meio otaku despertou em mim a vontade de escrever, comentando sobre o que eu consumia disso. Anos depois, estou eu aqui na Rádio J-Hero. E isso me incentivou a, hoje, estar numa faculdade de, vejam que loucura, Jornalismo.
Sim, Jornalismo. Nesse curso, aprendemos que em qualquer pauta que desejamos executar, devemos pesquisar a fundo sobre o assunto, que devemos apurar as informações obtidas das muitas fontes para não cometermos “barrigas” – vocês que prepararam o vídeo sabem o que é “barriga”, não sabem?
Vocês foram em sites como o nosso, especializados no assunto? Vocês consultaram profissionais ou amadores cosplayers para entender como funciona esse nicho? Ao assistirem o material final antes de ir ao ar, em momento algum cogitaram o quão tendenciosa e preconceituosa, diria até ofensiva, estava essa matéria?
Eu iria mais a fundo no assunto, mas a galera da Super-Con, que é um evento de cultura Pop lá do nordeste onde as pessoas vão para se divertir, encontrar com outros que curtam seus mesmos assuntos e etc., já fizeram isso por mim em um post lá na page oficial, contendo tudo o que vocês resolveram omitir, tiveram preguiça, ou se negaram a fazer: pesquisa, apuração e respeito:
NOTA DE REPÚDIO À MATÉRIA DO UOL QUE FALA SOBRE COSPLAYS
Em nome dos milhares de Cosplayers do Brasil, a Equipe Super-Con protesta contra a matéria veiculada pelo UOL que, ao nosso ver, foi tendenciosa e feita para polemizar, denegrindo a imagem de quem se diverte com um hobby sadio, mais do que isso, quem se diverte com a arte do Cosplay.
O Super-Con repudia veementemente a matéria e presta solidariedade à todos os Cosplayers brasileiros que se sentiram ofendidos com a tendenciosa edição e matéria veiculada na fanpage do UOL.
Conversamos com o Psicólogo e Cosplayer Leandro Aleixo que fez o seu TCC sobre Cosplay e ele comentou o caso. "A necessidade de representações heroicas fazem parte do homem enquanto constituinte de uma sociedade que cultua a singularidade do sujeito. O herói marca e estimula a passagem do indivíduo entre a vida infantil, passando pela adolescência e chegando na vida adulta. Buscamos heróis nas histórias míticas, na televisão e nos quadrinhos. Os animes e mangás (desenhos animados e história em quadrinhos japoneses, respectivamente) em particular, propiciam os adolescentes a participarem das atividades do cosplay. Uma forma dos adolescentes personificarem por um dia seus heróis, seus personagens favoritos em eventos especializados." – argumenta Leandro Aleixo.
Gostaríamos de argumentar os pontos citados pela psicóloga Leda Zancanella e pela Psicanalista Gislaine Dominicis:
1. "O Cosplay não favorece a integração, ele favorece a desintegração" disse a Psicanalista Gislaine Dominicis.
Completamente errado. A participação dos pais dos filhos praticantes do cosplay vem mostrando-se cada vez mais expressiva mostrando que a família tem um lugar especial na vida desses adolescentes. Partindo da simples elaboração da vestimenta e passando a participar de maneira mais ativa do jogo do cosplay, abrindo espaço para a possibilidade de pais e adolescentes verem-se dentro de papéis diferenciados daqueles instituídos socialmente e possibilitando que pais e filhos encontrem novas maneiras de se relacionarem enquanto constituintes de uma família patriarcal que transita entre o moderno e o arcaico.
2. "Ficar na fantasia é gostoso, é cômodo mas, ele pode passar a ter distúrbios graves e ignorar a realidade", disse a psicóloga Leda Zancanella.
Essa afirmação no caso maciço dos praticantes da arte do Cosplay não poderia ser mais equivocada. Cosplay é um hobby, é uma arte, é apenas mais um passatempo para a maioria esmagadora dos praticantes. O Super-Con existe há 11 anos e nós NUNCA ouvimos falar de ninguém que se vestisse de Cosplay 24 horas por dia.
3. "O eu da pessoa precisa sumir para vir esse outro eu. Só que é uma relação positiva e de orgulho de ser o outro e não de ser a si mesmo e esse é que é o perigo." disse a Psicanalista Gislaine Dominicis.
Como evento de Cultura Pop, nós premiamos aos que forem mais parecidos, tanto na caracterização quanto na interpretação do personagem, por isso, nós da Equipe Super-Con acreditamos que houve um exagero sem precedentes nessa afirmação. Ser Cosplayer é um Hobby e 'ser o personagem' faz parte da brincadeira de fazer Cosplay.
4. "O que liga é o ideal, o ideal do ego, eu gostaria de ser essa pessoa poderosa que tem a vida nas próprias mãos, nessa idealização eu me guio, eu mesmo sou uma porcaria, isso não ajuda à minha autoestima a melhorar e nem ajuda a minha auto aceitação, e nem ajuda também eu caminhar e trabalhar para chegar onde eu quero, porque não existe processo, eu me visto e já virei a heroína." foi o um dos comentários da Psicanalista Gislaine Dominicis.
O mais surreal dessa afirmação da psicanalista foi, em outras palavras, ela culpar o Cosplay pelo 'culto ao ego'. A prática do 'Culto ao Ego', nunca foi e nunca será culpa do Cosplay, é algo que está impregnado na nossa sociedade há milênios. Afora que, discordamos veementemente que os Cosplayers agem dessa forma.
Nós, da equipe Super-Con, acreditamos que, antes de fazer uma matéria sobre um fenômeno comportamental, que é o Cosplay, é necessário que seja feito um estudo mais consistente para melhor compreensão do tema coisa que, aparentemente, não aconteceu.
Gostaríamos de encerrar a Nota de Repúdio replicando o texto postado pelo Psicólogo e Cosplayer Leandro Aleixo: "Quem é Você de Verdade?" Perguntou a matéria do UOL. "A resposta é: Somos vários, e dentro desses vários que podemos construir quem somos de verdade!".
Recife, 21/08/2015
Equipe Super-Con – Super Convenção
Cliquem aqui para acessarem a página oficial deles no Facebook.
Aos interessados, está rolando uma petição online solicitando a retirada do vídeo do ar, ou mesmo um esclarecimento sobre o assunto, por não corresponder à conduta real dos praticantes de cosplay. Vocês podem participar clicando aqui.
Vocês também podem protestar usando suas redes sociais. É só postar algo com a hashtag #cosplaynaoedisturbio através do Facebook, Twitter e Instagram.
Apenas para terminar esse artigo, gostaria de enfatizar a minha pena e insatisfação por tudo isso. Pena por quão ofensivo deve estar sendo para cada um desses cosplayers entrevistados, que devem ter sido abordados de forma graciosa e educada e imaginavam que apenas espalhariam sua paixão e hobby por ai, que agora devem ter visto o quanto foram feitos de palhaços.
Pena das duas entrevistadas, que podem ter sido descontextualizadas e agora sofrem xingamentos na internet. Pena por toda a classe jornalística, que frequentemente é generalizada de forma pejorativa graças a posicionamentos desse tipo. E pena daqueles que realmente possuem transtornos de personalidade e de suas famílias, visto o assunto ter sido abordado de forma tão superficial apenas para ilustrar um ponto de vista mal construído.
E galera, querem saber, se realmente somos pintados como loucos por nossa cultura, o qual está crescendo e ganhando tanta visibilidade a ponto de incomodar os mais conservadores, vamos fazer como a Hyuna e as meninas do 4minute e preferir tal loucura à permanecer num quadradinho de comodismo social que tentam nos impor.
Não se deixe ser solitário / Ache o seu "eu" escondido no mundo, antes que seja tarde / Enlouqueça! Grite! Aproveite! / A vida é muito curta, então, todos devem enlouquecer!