O dia 23 de março de 2017 entrou para a história. Você pode achar que é de um pieguismo da minha parte falar isso, mas não é. Quem acompanha esse fenômeno que é Cultura Otaku sabe do que eu estou falando. Naruto encerrou um ciclo de 15 anos ininterruptos como é de se esperar de uma produção desse feitio. Nos dias de hoje manter animes sem pausas custa caro, e isso quer dizer tanto financeiramente quanto afetivamente.
Durante esses 15 anos (14 anos e meio para ser preciso) a série ganhou e perdeu adeptos, mas mesmo assim não deixou de ser uma das mais badaladas. o fenômeno de Naruto é muito mais expressivo que Saint Seiya (e olha que eu sou fã de Os Cavaleiros do Zodíaco ao ponto de considerá-lo meu anime n° 01). O anime baseado na história de Masami Kurumada tem um apelo afetivo em nós brasileiros pelo seu contexto histórico e tudo mais. Naruto é diferente. Assim como o Dragon Ball de Akira Toriama, as páginas do mangá do ninja loiro consquistaram adeptos no mundo inteiro e em grande proporções. Naruto é o Dragon Ball dos anos 2000 e 2010, mas por motivos distintos e que não recorrem a comparações. É um fato. Mesmo que One Piece se mantenha por anos líder de vendas de mangás (também sou fã dessa série) ele não teve a mesma receptividade que Naruto nos caminhos do Ocidente.
Naruto conta com uma estrutura de divulgação pesada graças aos esforços da Bandai Namco e mudou seu status por diversas vezes ao longo da jornada (falo da narrativa e não da personagem). De um mangá para uma versão adaptada em anime. De um anime para os games, e dos games para diversas outras mídias e formatos de consumo. Assim como uma boa franquia deve ser, Naruto tomou estratégias da narrativa crossmídia e chegou até mesmo desencadear eventos de narrativa transmídia em sua abordagem diante do público.
O filme longa-metragem é o maior exemplo disso. Antes dele outros seis filmes da fase Shippuden e mais três da fase Clássica já haviam sido lançados, mas nenhum deles desencadeou eventos na narrativa ou foi desencadeado por eventos na narrativa principal. Em Road to Ninja, por exemplo, os fillers dos animes anunciaram o filme, assim como em Laços (fui longe né!) que teve cenas do filme inseridas no clipe do tema de abertura Blue Bird da banda Ikimono Gakari. Tudo isso pura publicidade. Ações e estratégias crosmídia.
The Last ousou! Uma narrativa que se encaixava diretamente à principal e preenchia um lapso temporal deixado propositalmente pelo criador Masashi Kishimoto, que no mangá nos mostra o fim da Quarta Grande Guerra Ninja e depois avança no tempo nos mostrando os filhos de Naruto com Hinata. Mas e então: como o relacionamento deles aconteceu mesmo? Se não fosse por The Last nunca saberíamos, e mesmo assim muitos reclamaram disso.
Por muitas vezes Kishimoto deixou bem claro em entrevistas que Hinata ficaria com o Naruto no final. Ficar de zoação querendo um NaruSaku ou um NaruSasu (bromance muito defendido por parte do fandom) nos movia nas rodas de debates, mas era inevitável que o final seria um belo NaruHina. Isso porque NaruHina vai muito além do que apenas a união do protagonista com a garota que sempre o amou. NaruHina foi a forma subentendida de Kishimoto dizer que as condições de caos do Mundo Ninja – impostas após a luta de Hagoromo e Hamura contra sua mãe Kaguya e a separação dos dois irmãos – chegou ao fim. Hagoromo e Hamura (representados por Naruto e Hinata) voltavam a se encontrar e viver juntos como uma família (não estou insinuando incesto ou bromance, falo de laços fraternos).
Assim como Hamura sempre foi uma personagem sem muito destaque na trama, Hinata cumpria esse papel. Nem por isso foi uma persoangem esquecida. Mas falemos do episódio final (?) e do aguardado casamento!
De antemão digo que como vocês sou fã de Naruto e teria gritado por quase 20 minutos às 23h45 da noite se tivesse rolado a cerimônia inteira. Mas mesmo isso não acontecendo sei reconhecer que o episódio 720 (500 da fase Shippuden) foi sublime e satifez-me como fã da obra.
Como alguns sites, fanpages, fóruns e demais segmentos do fandom otaku alerta desde as últimas horas de ontem até o momento que escrevo isto, o casamento de Naruto foi exibido como tinha que ser feito. Daquele jeito e pronto. Você se pergunta o porque afirmo isso também? La vai:
1. Naruto já não era uma narrativa fechada. Ou consumimos tudo ou não consumimos. Os "fillers" que a galera disseram não ter sido bons (Konoha Hiden) não são fillers tirado do vento. Podemos até dizer que são semi-fillers. A história existe em outra mídia, as light novels, que contam justamente o pós-guerra. Lá também não temos a cerimônia;
2. Naruto é uma série com elementos de narrativa transmídia. No mangá vimos que Naruto teve filhos com a Hinata, logo se casou. No filme The Last vimos como eles começaram a namorar e a recepção após a cerimônia (cenas de pós-crédito).Na Light novel temos os preparativos do casamento e a ida deles ao altar. O que caberia ao anime? Mostrar a cerimônia! É o que todos dirão. Infelizmente não. Interpreto eu que mostrar a cerimônia inteira seria como ler o epílogo de um contos de fadas. Logo significa que seria FIM. Contudo ali não é um fim. O episódio em questão foi só uma transição. O anime serviu para nos introduzir em uma nova etapa da narrativa naquele universo: a fase "next generation"; a fase de Boruto.
3. Por fim, se compreeendemos que Naruto precisa ser consumido como um todo para ser compreendido, e se sabemos que ali não foi um fim e sim um novo começo, por que polemizamos tanto querendo que o nosso querer prevaleça diante de uma máquina destruídora como a indústria do entretenimento? Por que tanta polêmica? Será que era isso que Kishimoto e Cia (Produtores e demais envolvidos) desejam da obra? Não! Lógico que o foco é o livre comércio, é midiatizar mais e mais o ninja loiro. Mas lá no fundo, por parte de alguns (ou ao menos do Kishimoto) é uma forma de negação na hora de dizer adeus considerando o valor afetivo. Naruto lhes proporcionou ótimos momentos assim como fez conosco. E sentimos isso nas diversas fases da trama em que vimos histórias tristes e alegres, nascimentos e mortes para nos apaixonar pela narrativa. Foi preciso uma cena de beijo, de sexo ou algo semelhante para sabermos que quando Sarutobi Asuma morreu ele deixava uma criança orfã de pai no ventre de Kurenai? Foi preciso conhecermos Kushina desde sempre para sabermos que ela era a mãe adorada por muitos do fandom? E Zabuza e Haku? Nagato, Yahiko e Konan? A morte de Jiraya (já mais esquecido pelos fãs) para podermos sentir o turbilhão de sentimentos de tantos personagens que de certo modo contaram com o empenho do staff para que isso acontecesse, esse estado de catarse? Não, não foi preciso polemizar. Naruto é um shonnen mangá e como tal manteve sua proposta até o fim.
E agora, porque muitos que nem mesmo queriam que o Naruto terminasse com a Hinata, ficam reclamando da falta da cena de uma cerimônia nós vamos deixar de vivenciar essa experiência que tão cedo não se repetirá de novo para ficarmos de papo furado em nada construtivo. Otakus cresçam! Nós somos uma tribo social cheia de potencial na sociedade, mas que desperdiça tudo isso em discussões sem futuro. Naruto não lhes ensinou nada sobre querer ser respeitado pelo outros? Ele conseguiu, mas não pelo seu poder e sim pelo seu carisma. Seja no Mundo Ninja ou no Mundo Real.
Se Boruto dará continuidade aos feitos do pai só o tempo dirá (como um fã não aposto muito nisso). Mas como formador de opinião tenho certeza que lucros são nitidamente visíveis na continuidade do universo ninja, entretanto sei que a proposta de influenciar novos fãs descança e aguarda seu momento de agir mais uma vez.
Dattebayo e Sayonara.